terça-feira, 1 de abril de 2008

2a resposta ao biólogo sobre direitos animais

2a resposta ao pesquisador de Biologia Beny Spira, em http://stoa.usp.br/benys/weblog/18926.html.

1) está me parecendo que vc acredita que todas as assim chamadas ciências sociais e humanas não podem ser consideradas "ciências". é isso mesmo?

é curioso, vc insiste em separar "ética" de "ciência". e jogar "ética" junto de "crença", "religião" e "sentimentalismo". como se uma Ética séria não se valesse de diversas normas para fundamentá-la, dentro da Filosofia.

é exatamente contra esse imaginário que estou discutindo aqui. será q vc acha mesmo q os filósofos da USP e de outras universidades pelo mundo que estudam Ética são então nada mais que dogmáticos, religiosos e sentimentais, nem um pouco racionais?

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2) outra coisa, discordo de vc quando diz que a ciencia é essencialmente amoral. assim como tb discordo de se falar em um jornalismo essencialmente imparcial (isso é consenso na faculdade de Jornalismo).

ciencia e jornalismo nao sao amorais, porque o ser humano nao é amoral. e ciencia e jornalismo nao existem sem o ser humano agindo. tudo isso serve a determinados interesses, particulares ou coletivos. assim, a importância das ciências humanas e filosóficas está em verificar que interesses são esses, e se eles são ou não bem fundamentados, etc.

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3) concordo sinceramente contigo, podemos começar juntos agora mesmo uma campanha anti-natalidade, assim como existe na China. a hiper-população humana é um desastre, tanto para a coletividade quanto para as milhares de crianças sem condições de vida digna. podemos trabalhar juntos neste ponto.

mas veja os dados da parte inicial do vídeo A Carne é Fraca, a quantidade de bois e porcos, por exemplo, tb é exorbitante. aliás, vc está correto qto ao gás metano, este é um dos argumentos para o vegetarianismo.

concordo contigo que fatores ambientais implicam apenas em um quase total vegetarianismo (que se reduza bastante o consumo de carne; assim como se deveria reciclar praticamente todo nosso lixo, ou todo que fosse possível), não um vegetarianismo total necessariamente. de todo modo, se a população realmente tivesse esta mudança de atitude ao reduzir o consumo de carne ao máximo (digamos umas vezes por semana ou por mês, ao contrário de como é de praxe, que é consumir sempre) já seria excelente, por diversos motivos.

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4) qto aos animais de estimação (ou "pets"), uma idéia interessante é que sejam acolhidos os que já vivem, mas também deve ser desestimulada sua natalidade. é praticamente consenso entre os protetores de animais que haja campanhas de castração de cães e gatos. e que eles nunca sejam vendidos, mas doados quando necessário. (a propósito, este ponto foi discutido na reunião do grupo de estudos de direitos animais que eu coordeno, este sábado, no CCSP)

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5) A respeito das diferenças entre animais e vegetais, obrigado por sua informação sobre nova classificação de reinos, desconhecia. mas ainda assim as diferenças entre eles parecem bem relevantes em termos éticos. A este respeito cumpre indicar 3 textos já escritos, disponíveis em meu outro blog, caso tenha interesse. Eu apreciaria muito se vc, quando puder, fizesse uma crítica a eles (repare que o melhor não é o primeiro, que é meu, mas sim o do professor Gary Francione, que está mais abaixo; e em segundo lugar o da Simone Nardi):

http://mauricio-kanno.blogspot.com/search/label/direitos%20das%20plantas

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6) ah, desculpe, faltou justificar um aspecto sobre

Você está preocupado com o fato de que muitos animais devam ser criados para satisfazer as necessidades humanas e que isto leva a um maior cultivo de vegetais. Certo? Mas não entendi onde está o problema.

falei isto apenas porque vc não está atribuindo valor ético à consciência, senciência, capacidade de sentir e ter interesses, psicologia, que é o critério moral (considerado relevante) dos defensores dos direitos animais, que diferenciaria os animais dos vegetais.

considerando a hipótese de você, assim como eu antigamente, dar um valor à "vida" simplesmente, independente de ser senciente ou não, aquele argumento ecológico serve também a favor do vegetarianismo, pois mostra que se sacrificam mais vidas, sejam elas sencientes ou não, quando as pessoas não são vegetarianas.

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qto ao ponto 2, apenas retifico: me referi à "ciência e ao jornalismo" "aplicados", não "puros" e "ideais", como se isso existisse. é como aquela história do elétron e do observador... foi apenas uma reflexão a mais, mais ampla, por outro ponto de vista.

qto a considerar esta ciência "per se", "pura" e "ideal", não aplicada, há que considerar somente meu ponto 1.

Grande abraço, é um prazer debater contigo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Parabéns pelas respostas Maurício!Mandou ver!

No entanto, estou plenamente de acordo com o Spira quando ele afirma que a ciência é essencialmente amoral. Tanto é que o melhor método científico para se descobrir a cura de doenças que afligem os seres humanos é o da vivissecção humana.

Já a discussão sobre direitos animais é essencialmente moral. Se partimos do pressuposto de que todos os seres humanos possuem direitos básicos, não há como não estender estes mesmos direitos a todos os indivíduos sencientes sem cair no especismo. Mas é óbvio que podemos recorrer a argumentos puramente científicos ao defendermos uma determinada posição de ordem moral. No caso dos direitos animais, é fundamental nos basearmos em critérios puramente científicos quando discutimos se um determinado indivíduo é senciente ou não.

Fora isso, questões morais nada têm a ver com questões científicas. Do contrário, um escravagista poderia argumentar que o fato dele possuir escravos não contraria a nenhuma lei da física, da química ou da biologia. E não deixaria de estar com razão.

Um abraço,

Cláudio Godoy